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Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa | Crítica

Este ano é um marco pra história do cinema de heróis. Como Aves de Rapina, todos os principais lançamentos do cinema baseado em quadrinho serão protagonizados por personagens femininas. Tardio, eu sei, mas ainda sim, necessário. Talvez os grandes estúdios tenham demorado pra entender, e por consequência valorizar, suas personagens femininas. 

Eu sei que você está com Mulher Maravilha (2017) e Capitã Marvel (2018) na ponta língua. Errado não está, eles já existem, mas vieram também tardiamente e são, tristemente, as únicas peças no portfólio de empresas que se vendem tão diversas.

Não, eu não defendo que o simples fato de serem diversos em sua essência os tornem obras ilibadas, irretocáveis e imunes a críticas. Acho sim, que enquanto eles forem raridades, devam ser valorizados pela coragem, já que a cultura geek é um antro de macho, hétero e branco – me incluo nos dois primeiros – e entrar no circuito reforçando o contrário desse arquétipo é vir preparado pra críticas além do aspecto técnico ou artístico. A obra é julgado pela abordagem diversa.

Partindo do textão acima, já adianto, Aves de Rapina está longe de ser o melhor filme de super-heróis da última semana, na verdade nem acredito que seja o objetivo dele, mas é, certamente, um dos projetos mais interessantes da DC/Warner para o cinema e saí extremamente satisfeito com toda a ação e diversão entregues no longa.

Dirigido pela cineasta chinesa Cathy Yan (Dead Pigs), com o roteiro da talentosíssima Christina Hodson (Bumblebee, The Flash) e produzido por Margot Robbie, a protagonista da Arlequina. O longa acaba com o “argumento” dos famosos haters de comentários, que repetem à exaustão: “Não tem que escolher diretor pelo sexo ou cor, tem que ser pelo talento”. Amado, talento e capacidade é básico em qualquer currículo de diretor ou roteirista de Hollywood. Esse trio é uma reunião de talento, profissionalismo e ousadia e entregaram um filme que fala muito de como as mulheres podem se emancipar de paradigmas sociais e normativas masculinas, sem ser panfletário, em momento algum.

Aves de Rapina conta a historia de Arlequina, após o fatídico Esquadrão Suicida, com seus traumas e de como ela evoluiu após isso. Ela acaba se unindo a outras mulheres com histórias complicadas que acabam em um grupo pra enfrentar um gangster de Gotham. 

O roteiro é inteligente e enxuto, à exceção do primeiro ato, que se arrasta para criar alguma empatia com a protagonista e estabelecer as personagens secundárias de forma rápida e sem se aprofundar muito. Pode ser que isso incomode algumas pessoas, mas fica claro que a produção e a direção tinham como objetivos manter o dinamismo da montagem pra promover a ação e diversão ao invés da história, que fica em segundo plano.

O longa não se leva a sério, e isso é muito bom. É como se fosse uma piração estética technicolor, com uma linha do tempo cheia de indas e vindas. A trama é contada por pontos de vistas diferentes e unidas a cenas de ação muito bem coreografadas.

A lembrança de John Wick não é mera coincidência, a mesma equipe do filme do mercenário trabalhou em Aves de Rapina. É um espetáculo visual.  

O grande problema do filme é estar repleto de boas ideias, que às vezes ficam desorganizadas e falta um grude pra conectar tramas e masterpieces de maneira mais orgânica. Aí o roteiro acaba falhando, como se abrisse mão da coesão em função da diversão.

Margot Robbie está muito à vontade no papel, e se sobressai sempre que está em cena. Dificuldade que visivelmente encontram Mary Elizabeth Winstead (Canário Negro) e Jurnee Smollett-Bell (Caçadora) em seus papéis. A primeira é típica personagem que se envolve sem querer com o crime e a segunda, uma sobrevivente em busca de vingança. Dois arquétipos clichezaços de filmes sobre gângsters, que são levados a sério demais, e poderiam ser tratados como piada como personagem de Rosie Perez, a detetive Montoya, que parece ter saído de um blockbuster de “tiras” dos anos 90. O roteiro mesmo brinca com isso. Esse desenvolvimento dificulta o trabalho das atrizes, que até parecem se esforçar, mas falham em criar empatia, à exceção dos momentos mais cômicos.

Já o vilão de Ewan McGregor é brega, canastrão e caricato, mas que incrivelmente funciona para o longa. A motivação dele é pífia, esquecível e muitas vezes desastrosa, porém a função dele ali é claramente dificultar a vida de Harley pro filme ficar ainda mais divertido. Apenas isso. As cenas dele com Chris Messina (Victor Zsasz) são as mais sonolentas e patéticas.

No geral o filme é fiel ao que se propõe, sem muitas pretensões de ser arte é diversão pura e mostra que a DC pode ser sim divertida e engraçada, do seu jeito, mesmo que reaproveitando muita coisa de Esquadrão Suicida, Aves de rapina tem um voo solo, independente, ou melhor, emancipado, de seu antecessor. Vida Longa à Margot Robbie.

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